Por Luiz Philippe Orleans e Bragança – Gazeta do Povo
O problema vai além da região devastada pelas chuvas. O que está ocorrendo com os gaúchos poderia estar acontecendo no estado de São Paulo, Minas Gerais – a exemplo de Brumadinho – Rio de Janeiro – a exemplo de Petrópolis – ou em qualquer estado do Brasil. O que não surpreende, mas causa revolta, é que a situação se repete sem nenhum aprendizado. O governo federal não tem serviços ou infraestrutura em cada estado que possam minimizar possíveis riscos, seja de inundações, incêndios, ciclones, tornados e até mesmo raios. Devemos levantar as mãos para o céu e agradecer que não temos vulcões em atividade.
Ao mesmo tempo, o governo estadual também parece estar perdido, desconhecer a zeladoria das cidades de seu Estado e ignorar medidas de prevenção. Nem mesmo a passagem de um ciclone extratropical, há oito meses, ligou o sinal de alerta das autoridades rio-grandenses. Considerado um dos piores fenômenos naturais, ele também causou inundações, atingindo 57 mil pessoas e deixando 54 mortes. Quatro pessoas ainda estão desaparecidas.
Ineficácia
Recentemente, o ministro da Defesa esteve na Câmara dos Deputados para divulgar as ações sociais do Exército Brasileiro, ao que minha contestação foi de cobrar alguma ação no âmbito da Defesa Nacional, seja de nossas fronteiras terrestres, marítimas ou aéreas, uma vez que o Estado brasileiro já está comprometido, e muito, com assistencialismo e demandas sociais.
Por coincidência, algumas semanas depois, em uma situação em que o Exército poderia agir no resgate das vítimas das chuvas em várias cidades do Rio Grande do Sul, as Forças Armadas deram o exemplo do contrário. A impressão que se teve por vários testemunhos era de ineficácia. Por mais que tenham agido e de fato terem salvado vidas, a percepção geral foi de baixa efetividade.
Burocracia Mata
Além disso, empecilhos burocráticos estão limitando até a ação de indivíduos e comunidades locais no auxílio às vítimas, impedidas de receber doações ou de serem resgatadas rapidamente. A impressão que se tem diante desse cenário de quase inação do estado é de que falta motivação para o Estado agir, arriscar-se, como se seu bem-estar pessoal estivesse garantido, enquanto que vários de seus eleitores e financiadores pudessem perder tudo, inclusive a própria vida.
Estado grande – e fraco
Nesse contexto, temos que analisar quatro componentes que estão interligados no Rio Grande do Sul:
- Terra: qual a riqueza que ela produz e o tamanho de seu território?
- Gente: qual o tamanho, a qualificação e a força de trabalho?
- Capital: qual a capacidade da terra e da gente gerar capital próprio?
- Governo: o que o governo faz com o capital gerado?
No caso do Rio Grande do Sul, a terra é vasta e rica, a população é qualificada e trabalhadora e o capital gerado é monumental, gerando um dos maiores IDHs do Brasil e da América Latina. Infelizmente, a alocação de capital pelos governos é consistentemente péssima. Trata-se de um padrão que se observa em todo o Brasil.
É notável o exemplo de Nova Roma do Sul, que construiu uma ponte com recursos da própria comunidade e empresários locais. Atingida por um ciclone, a cidade arrecadou cerca de sete milhões e fez as obras prometidas pelo governo estadual, que a orçou por 25 milhões, e com prazo de finalização para dali a um ano. Com iniciativa local, a ponte custou cinco milhões, foi construída em quatro meses, e ainda sobraram dois milhões que foram investidos em obras de reconstrução no entorno.
Onde está o erro?
No Estado Social. Essa mentalidade vencida plantada na Constituição faz o Brasil alocar sistematicamente recursos em benefícios sociais como previdência, saúde, educação e assistencialismo – todos esses são gastos – sem nenhuma contrapartida, apenas para coagir eleitores.
A prioridade orçamentária deveria ser em investimento para diminuir deficiências competitivas. Estou falando de Defesa e Infraestrutura, pois essas duas áreas geram multiplicadores econômicos e sociais sustentáveis e constroem alicerces nos quais mais estruturas podem ser criadas: saneamento, rodovias, aeroportos, ferrovias, portos, aviões, helicópteros, barcos, veículos de transporte e tecnologia de armamento, serviços de alerta, de emergência e de defesa etc.
A inversão da lógica orçamentária nos colocaria no primeiro mundo em menos de uma geração.
O maior dos roubos
O maior desvio que ocorre no Brasil é dos impostos gerados nos estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste para os estados do Norte e Nordeste. Há um cartel de governos do Norte e Nordeste organizados para sugar recursos de Brasília para suas regiões de forma desproporcional arrecadadas por seus estados. Alguns estados recebem até o dobro de recursos federais em relação ao que geram localmente. No caso dos estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, os estados recebem uma fração do que arrecadam em impostos federais.
Brasília tem servido como distribuidor de renda gerada nos estados ricos para os estados geridos por notórios corruptos e ineficientes. Isto é, não distribui renda, mas a direciona para os amigos do Norte e Nordeste, em regiões dominadas por esquemas e oligarquias. A população do Norte e Nordeste não vê esses recursos. Se recebesse de fato as centenas de bilhões de recursos federais já teria um IDH muito mais elevado do que aquele tem hoje.
São políticos viciados em recurso federal sem dono, que não fazem o dinheiro chegar ao cidadão, nem resolvem o problema da infraestrutura em seus estados – mas sempre garantem sua eleição e de seus “apadrinhados”.
Livrar o Norte-Nordeste da mesada paga pelo resto do Brasil tem de ser visto como um incentivo à desregulamentação, equilíbrio fiscal e a boa gestão e pode destravar a riqueza que historicamente sempre existiu por lá mas foi soterrada pelo coronelismo.
O povo do Rio Grande do Sul pagou em tributos federais o valor de R$57,4 bilhões para o poder central de Brasília, e recebeu de volta para ser usado em favor da sua região somente R$ 13,3 bilhões. Imagine se recebesse o equivalente que paga todos os anos por 10 anos e investisse prioritariamente em infraestrutura e defesa…imagine.
Tornamos a tragédia ainda maior não aprendendo com ela. O que o Rio Grande do Sul ensinou ao Brasil é que a burocracia mata, que não se deve contar com o poder público e que o povo gaúcho continua forte e vai sair dessa mais forte ainda.