Todos os nove ministros que votaram entendem que falta transparência ao atual modelo. Decisão do plenário ficou para a próxima segunda-feira (19), após Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski pedirem mais tempo para análise.
Por Rosana D’Ágostino – g1 – Brasília
Os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes pediram mais tempo para análise, e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o orçamento secreto foi adiada para a próxima sessão, na segunda-feira (19).
Orçamento secreto é o nome que foi popularmente dado às emendas de relator depois de 2019, quando o relator do Orçamento da União ganhou poder de distribuir bilhões em emendas parlamentares.
O STF analisa ações de partidos políticos que alegam que o orçamento secreto é inconstitucional, em razão da falta de transparência na distribuição das emendas e da falta de critério na escolha do deputado ou senador que será agraciado.
Quando o julgamento foi interrompido, 9 dos 11 ministros já haviam votado.
- 5 deles votaram para extinguir o orçamento secreto e limitar o uso das emendas de relator apenas para “correções” no orçamento, sem indicações parlamentares, como era antes de 2019. Os 5 são: Rosa Weber (relatora), Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Luis Roberto Barroso.
- 4 votaram entendendo que as emendas de relator podem continuar sendo distribuídas pelo relator do Orçamento, desde que com critérios mais transparentes. Os 4 são: André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes. Entre eles, porém, houve divergência quanto a quais medidas adotar para aprimorar o modelo.
Congresso tenta solução
O Congresso não quer ver o fim do orçamento secreto. Para evitar essa perda, as mesas da Câmara e do Senado propuseram na terça-feira (13) um projeto para estabelecer critérios claros de distribuição das emendas de relator.
O texto:
- estabelece percentuais específicos das emendas para as cúpulas do Senado e da Câmara;
- reserva parte das emendas para o presidente e o relator da Comissão Mista de Orçamento (CMO);
- prevê que o restante das emendas será distribuído entre os partidos, de acordo com o tamanho das bancadas.
Esse projeto ainda não foi aprovado no Congresso.
Os votos dos ministros
- Violação do ‘princípio republicano’
A primeira a votar foi a ministra Rosa Weber, presidente do tribunal e relatora do caso. Ela deu o voto na quarta-feira (14).
Para Rosa, o destino dessas verbas é “recoberto por um manto de névoas”.
“O modelo em prática viola o princípio republicano e transgride os postulados informadores do regime de transparência dos recursos financeiros do Estado”, afirmou.
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- Divergência
O primeiro a votar nesta quinta foi o ministro André Mendonça. Ele abriu uma divergência com relação ao voto de Rosa Weber.
Para o ministro, as emendas de relator devem ser mantidas, em nome da separação de poderes, já que os parlamentares podem propor emendas ao orçamento. No entanto, Mendonça votou para dar 60 dias para que o Congresso garanta a transparência das emendas.
“Não entendo possuir razão na alegação desenvolvida no sentido de que as emendas de relator seriam inconstitucionais, por não possuírem a mesma estatura normativa das emendas individuais e de bancada (…) Sempre houve emendas de relator para além das hipóteses de erro e omissão.”
- Desconsiderou as ações
Para o ministro Nunes Marques, as ações dos partidos contestando o orçamento secreto sequer deveriam ser consideradas.
Isso porque, segundo o ministro, cabe ao Congresso decidir sobre as emendas. Mas também entendeu que falta transparência no modelo atual.
“Orçamento público e parlamento são ideias inseparáveis. Não se pode cogitar de orçamento sem a ideia de aprovação parlamentar”, declarou. “Qualquer cidadão tem que saber a mando de quem foi destinada qualquer verba pública.”
- Critérios de proporcionalidade
O ministro Alexandre de Moraes também divergiu da relatora, no sentido de que, para ele, as emendas de relator podem continuar.
No entanto, Moraes defendeu que haja critérios de proporcionalidade e que sejam identificados origem e destino das verbas.
Moraes disse que a falta de transparência das emendas gerou deformações e que o critério político não pode ser arbitrário.
“Essa origem ficou sem transparência, tanto ficou sem transparência que, no momento em que se faz uma pergunta à Câmara, ao Congresso: essa emenda, vem de quê, o que indicou ao relator? Com todo esforço que foi feito pelo presidente do Senado, da Câmara, nós chegamos, salvo engano, em torno de 72% na câmara e 85% no Senado de identificação ao longo de um ano.”
- Emendas inconstitucionais
O ministro Edson Fachin acompanhou a relatora. Ele afirmou que não é possível saber a origem e o destino das emendas de relator, por isso, elas são inconstitucionais.
“O que nós estamos tratando é de uma alocação racional dos recursos nacionais, que deve ser levada a efeito à luz da Constituição. O RP9 [emendas de relator] presta contas à origem e ao destino? Mesmo nos votos divergentes, fica evidenciado, a resposta é negativa. Esse indicador não cumpre as regras constitucionais”, disse.
- ‘Orçamento não pode ser secreto’
O ministro Luís Roberto Barroso também acompanhou a relatora. Ele afirmou que o orçamento secreto estabeleceu um “toma lá dá cá” nas relações entre o poder Executivo e o Congresso.
“Numa democracia e numa República não existe alocação de recursos público sem clara indicação sobre de onde provém a proposta e para onde chega o dinheiro e se chega o dinheiro. O orçamento não pode evidentemente ser secreto em nenhuma de suas dimensões”, afirmou.
- ‘Tem que ser publicizado’
O quarto ministro a acompanhar o voto de Rosa Weber foi Luiz Fux.
“Isso não pode ser secreto, tem que ser publicizado como exige a própria Constituição Federal”, argumentou. “Se não há fundamento constitucional e se não há essa transparência, com dinheiro público o segredo não é a alma do negócio.”
- Princípio da transparência
O ministro também entende que as emendas de relator podem continuar. Ele também votou para dar mais transparência ao processo.
“As emendas de relator estão sujeitas aos princípios constitucionais e legais do ordenamento jurídico pátrio, desde que elas atendam ao princípio da transparência, com a indicação do parlamentar responsável e respectivos beneficiários diretos”, afirmou.
- ‘Barriga de aluguel’
Cármen Lúcia foi a quinta ministra a votar junto com a relatora.
“Não é possível se adotar uma emenda com barriga de aluguel. Quem é o responsável por isso? Não há emenda que se possa fazer frutificar a partir dessa condição”, disse.