Colegas do policial civil assassinado se concentraram próximo ao local das mortes, em Montenegro
Passamos a manhã desta terça-feira conversando com experientes policiais civis e militares sobre a morte de mais um colega, o sexto do ano (cinco em serviço e um de folga). O quarto em três semanas. Uma primeira hipótese é afastada por todos, a de que as organizações criminosas tenham ordenado uma caça a agentes da lei. Isso não faz sentido, porque os autores de crimes eram de quadrilhas diversas e de ramos variados da criminalidade – um até tinha mais de 60 anos e era abigeatário, sem antecedentes violentos, conforme a Polícia Civil.
Os policiais trabalham com uma série de elementos que podem representar vida e morte na sua profissão. Sem entrar em detalhes de casos específicos, aqui alguns exemplos:
Fatores externos e abrangentes
Criminosos mais ousados – a transferência de chefes de facções para prisões de segurança máxima em outros Estados pode ter deixado acéfalas as organizações criminosas, ainda que temporariamente. Isso gera ascensão rápida de gerentes de quadrilha nem tão experientes. Pensam pouco e agem violentamente. Acostumados a enfrentar à bala os rivais, acabam fazendo o mesmo em relação às polícias, mesmo que isso resulte em grande incômodo para a organização.
Legislação branda – em pelo menos dois casos recentes de mortes de policiais, dois envolvidos deveriam estar com tornozeleira. Um deles não estava porque havia falta do equipamento por parte do poder público e ele foi libertado, embora devesse estar preso. No outro caso, o prisioneiro simplesmente se livrou da tornozeleira e permaneceu foragido. Policiais encaram isso como sinal de procedimentos frouxos por parte da Justiça.
Policiais confundidos com bandidos – é cada vez mais comum quadrilhas usarem uniformes policiais para cometer crimes, aí incluídos sequestro e assassinato de rivais. Aconteceu isso com Orides Telles da Silveira, o Bonitinho, notório ladrão de bancos, sequestrado e decapitado em 2017 em Gravataí por adversários vestidos de policiais civis. No mesmo ano, naquela mesma cidade, um policial civil foi morto em operação por assaltantes que alegaram ter imaginado que eram alvo de ataque de facção rival _ atiraram através da porta, como ocorreu nesta terça-feira em Montenegro.
Conjuntura específica desfavorável
Surpreendidos pelo alvo – muitas vezes o policial desconhece seu alvo. Em operações policiais planejadas, é comum que o agente saiba pouco sobre quem vai prender ou quem é o dono do local revistado. Quando não é da região e está prestando apoio, ele recebe um envelope com endereço, dados básicos e o que deve ser procurado. Isso é feito para evitar vazamento de detalhes da investigação. O que aparenta não ser perigoso, pode se tornar. Em ações não planejadas, ignorar a identidade do alvo é ainda mais comum. Ao deparar com um carro roubado, por exemplo: difícil para o policial saber quantos bandidos há ali e que armamento eles possuem. A decisão de abordar é tomada em segundos. Por isso, é recomendada supremacia de força e cerco ao veículo, mas nem sempre há efetivo disponível para isso – e a sociedade pressiona por respostas rápidas. Situação difícil.
Saber quando atirar – muitos policiais, ao analisarem a morte recente de colegas, comentaram reservadamente que talvez tenha faltado chegar com mais energia ao alvo. Pronto para disparar ou disparando, quando se trata de criminosos. Mas o problema é que sempre pode haver um refém no meio dos bandidos. Aconteceu isso em recente abordagem que terminou com PM morto: os ladrões conduziam uma refém. Ela não foi atingida, mas o policial foi assassinado.
Em resumo, vida de policial não é fácil. Se chegar mole, pode levar tiro. Se cometer excessos, vai ser processado por isso, resumem os colegas de mais esse agente morto pelo crime.
Gauchazh – Por Humberto Trezzi