Senadora Ana Amélia Lemos, um dos poucos quadros do PP excluídos da lista do petrolão, admite que pode deixar a sigla e revela afinidade com o PSDB
Por: Marcela Mattos, de Brasília – Atualizado em
A Operação Lava Jato fustigou uma lista de nomes de políticos, mas nenhuma sigla foi tão atingida quanto o Partido Progressista (PP). Delator do petrolão, o doleiro Alberto Youssef apontou a participação de 32 políticos do PP no esquema de corrupção na Petrobras. Diante da quantidade de nomes, os investigadores resolveram mudar a pergunta: quem não recebeu propina? Youssef apontou o ex-prefeito Paulo Maluf (SP), o deputado Jair Bolsonaro (RJ) e a senadora Ana Amélia Lemos (RS). Alinhada à oposição ao governo, Ana Amélia já recebeu convite do PSDB, PRB e do Solidariedade para mudar migrar de partido. Mas afirma que pretende aguardar uma posição da direção da legenda para definir seu futuro. "O PP tem de tirar todas as laranjas podres. Se você não tira uma laranja que está estragada, todas as outras correm o risco de ficarem estragadas. A contaminação é muito rápida", afirmou em etrevista ao site de VEJA.
Passadas duas semanas da divulgação da lista do petrolão, o que mudou no PP? Foi extremamente preocupante e não esperávamos que um número tão expressivo de parlamentares da nossa bancada federal estivesse nessa lista. O desgaste político já está consumado. Por mais que eles sejam inocentados, o prejuízo é irrecuperável. Todos, dentro do estado democrático de direito, terão a necessária defesa para provar a inocência nesses episódios. Mas, para aqueles do partido que forem denunciados pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário por envolvimento em atos ilícitos de corrupção, nós teremos de usar a mesma régua moral que nós usamos para o adversário. Não tem de passar mão na cabeça, ser complacente ou assumir um caráter paternalista num ato que tem um alcance político grave e que é preciso que todos aqueles que foram responsabilizados paguem pelos delitos cometidos. Por enquanto, sabemos apenas que eles foram incluídos numa lista para investigação. A partir da investigação é que terá elementos para dizer que foi cometido ou não um delito grave. É nesse momento que haverá uma posição mais firme.
Como está o clima no partido? As reações são diversas. Nós tivemos deputados que saíram vociferando que o partido acabou. O partido não pode acabar. É comum que confundam partidos com pessoas. Mas partidos são instituições. Um juiz, como aquele que pegou o carro do Eike Batista, cometeu um ato individual. Não foi a instituição do Judiciário que cometeu aquilo. É um juiz sem escrúpulo, irresponsável e que era um bandido que estava do lado errado.
Mas no partido a exceção é quem não foi citado. Falando do PP gaúcho, o partido tem um patrimônio que, como instituição, não se pode ignorar. E ainda há uma questão sobre mudança de partido muito séria: os gaúchos prezam muito a lealdade e a fidelidade. Mudar de partido não é uma situação aceita com normalidade por eles. O PP tem, no Rio Grande do Sul, 230.000 filiados, está com diretórios municipais em 480 municípios de um total de 497. Nós temos o maior número de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores. Essa instituição que se chama Partido Progressita no Rio Grande do Sul tem peso político e tem um presidente, Celso Bernardi, que é um político respeitadíssimo. Esse é um processo doloroso para todos nós, especialmente para aqueles que querem fazer uma política diferente, não entrando nesses processos de organização criminosa. Agora, se aqueles que foram incluídos na lista forem de fato denunciados, os procedimentos serão os mesmos de sempre: punir quem deve ser punido e expulsá-lo do partido. Se não houver uma depuração nesse processo, é evidente que nós temos de examinar uma alternativa.
Por exemplo? Várias. Uma delas seria sair do partido. Mas, neste momento, essa alternativa ainda não está no nosso radar, é apenas uma hipótese. Confirmadas as denúncias, as pessoas têm de ser expulsas. Se não for possível isso, por alguma razão legal ou política, eu vou sair do partido. É separar o joio do trigo. Vamos conversar com todos e decidir uma atitude coletivamente. Vamos tentar fazer uma assepsia. Mas se avaliarmos que não dá mais, vamos mudar.
Em qual partido a senhora ingressaria? O Aécio Neves, muito gentilmente, me convidou logo na semana que foram iniciados os trabalhos no Congresso, em fevereiro. Nós estivemos juntos na campanha e eu o apoiei. Eu estava com o Aécio nos momentos mais dramáticos da campanha, principalmente quando a Marina Silva estava à frente na disputa. Ele sabe o que eu fiz, e eu fiz com vontade, com crença de que fiz a escolha certa. Se tiver isso, podemos dizer que o PSDB é um partido com o qual tive afinidades na campanha e seria uma opção. O Aloysio Nunes também veio falar comigo e eu disse a eles que uma saída do partido no Rio Grande é um ato coletivo, eu não posso sair sozinha. O senador Crivella, do PRB, também me convidou e foi muito gentil, assim como o Paulinho da Força, do Solidariedade.
A senhora avalia que o envolvimento de tantos políticos do PP no petrolão pode prejudicar o seu discurso pela ética? O meu discurso é de responsabilidade, é de respeito às coisas públicas. Você acha que para mim é confortável o Youssef dizer que eu estou fora do esquema de corrupção? Não é bom, não é agradável e não me conforta, porque eu não queria que o meu partido estivesse tão contaminado com toda essa sujeira e essa situação absolutamente condenada. Isso me frustra muito. Mas eu percebo que o eleitor não mistura a pessoa com o partido. Tanto que eu perdi uma eleição ao governo do Estado na qual o PT e seus sindicatos petistas fizeram uma campanha sórdida. Mas as pessoas continuam me procurando e as demandas em meu gabinete estão cada vez maiores. As pessoas continuam olhando para mim com respeito. É a minha garantia de que não fui contaminada por esse tsunami. Se por um lado é gratificante, por outro é uma pena que isso esteja acontecendo no ponto de vista do conjunto do partido.
Qual o futuro do partido? Eu acho que o partido tende a reduzir de tamanho. Nacionalmente, vai com certeza ficar menor. Hoje, são 1,5 milhão de filiados, não é um partido pequeno. Há um dano político grave e irreparável de imagem. O PP costuma ser relacionado ao Maluf. Agora é o PP do petrolão, da Lava Jato, da mensalidade na corrupção na Petrobras. Há de se considerar também que o ex-diretor Paulo Roberto Costa foi indicado pelo comando partido em 2002 e ele, pressionado pela família, decidiu abrir a boca – e fez muito bem. O fato é que ele está contribuindo para tentar desvendar toda essa organização. Agora, o Renato Duque [ex-diretor de Serviços e braço-direto de José Dirceu] ficou de boca calada na CPI. Há uma fidelidade, um outro tipo de comportamento. É um cara que vai para o sacrifício para salvar o partido que ele defende. Mas esse pessoal é ideológico, não espere deles a mesma atitude do Paulo Roberto Costa. O PP tem de tirar todas as laranjas podres. Se você não tira uma laranja que está estragada, todas as outras correm o risco de muito rapidamente ficarem estragadas. A contaminação é muito rápida.
Quem seriam as laranjas podres? Eu prefiro falar sempre no meu estado primeiro, não adianta falar de fora sabendo que tem cinco de seis da bancada listados. Eu preciso olhar sempre os quatro cantos da minha casa para olhar a casa maior. Mas é evidente que os líderes são nacionais. Já foram identificadas algumas pessoas. Um deles, José Janene, já morreu. Um já foi preso também, no julgamento do mensalão, o Pedro Corrêa.
Além do risco eleitoral, o PP pode ser prejudicado no governo? Sim. A própria presidente já sinalizou isso. A Dilma sabia tanto que tirou do PP um dos mais importantes ministérios, de capilaridade reconhecida, que é o Ministério das Cidades, entregue ao PSD. Isso já foi um sinal de redução de poder. Antes da lista conhecida, a Dilma já tinha esvaziado o PP. O partido perdeu a expressão que tinha. O PP vai ficar menor, vai minguar. O Bolsonaro mesmo está querendo sair, ele fala em alforria. Do ponto de vista político, eu preciso alegar incompatibilidade de gênero e de valores. Mas seria imprudente da minha parte sair sem ter uma segurança jurídica do que está acontecendo.
A senhora fala em assepsia da política. Defende que esse mesmo gesto seja tomado pelo PT? E dá para fazer esse discurso? (Risos) Mas eu não quero pautar a atitude de ninguém, nem de governo nem de político nem do meu partido. Eu quero fazer aquilo que a minha consciência determina que eu faça. Eu tenho feito insistentemente na tribuna do Senado discursos dizendo que a presidente da República está indo por um caminho em que ela não receberá o apoio necessário para fazer as mudanças que precisa fazer. Porque ela em nenhum momento admitiu equívocos cometidos na administração pública. A Petrobras foi esquartejada em partidos políticos que tomaram conta de uma empresa petroleira. É uma área técnica e tinha de ter só especialistas no setor, mas a Dilma vem a público apenas para dizer que 'a corrupção é uma senhora idosa' e não começou no governo dela.
De acordo com Youssef, o PP recebia uma propina mensal. Não era possível perceber nenhuma movimentação? Eu sou daquele tipo que coloco a cabeça olhando para um lado e sigo. Eu não tenho convivência partidária, eu faço meu trabalho e estou sempre muito concentrada no mandato. Esse processo ocorria na Câmara. Eu não tenho essa proximidade, nem mesmo com os deputados do Rio Grande do Sul. Às vezes eu passo meses sem ver ou conversar com um deputado do meu partido. Nós nos encontramos mais em eventos políticos e comícios. Agora, quem opera, vive disso e entende como é. O diabo sabe para quem aparece. Essas coisas são naturais que sejam assim, e não à toa não apareceram para mim. Um detalhe é que o Cid Gomes [ex-ministro da Educação] foi demitido por ter feito uma declaração de que as pessoas estão no Congresso para fazer negócio. É lamentável a imagem do Congresso ficar com todo esse prestígio lá embaixo. O pior que é a calunia às vezes é verdadeira. Veja