Quando missa começou, vaso caiu com o vento do temporal, mas cerimônia seguiu em Três Passos (Foto: Rafaella Fraga/G1)
Celebração é realizada na noite deste sábado (2) em Três Passos.
Quando a cerimônia começou, um temporal atingiu a cidade.
A morte de Bernardo Boldrini, assassinado aos 11 anos em abril de 2014 no Rio Grande do Sul, foi lembrada em uma missa realizada na noite deste sábado (2) em Três Passos, no Noroeste do estado, onde o garoto morava com a família. Coroinha da Igreja Matriz, o menino foi homenageado na celebração, que durou pouco mais de uma hora.
Logo que começou a missa, por volta das 19h, se iniciou um temporal. As últimas pessoas entravam na igreja, e tiveram de se apressar. Um vaso que estava posicionado em frente ao altar caiu no chão com a força do vento. As portas foram fechadas, e a cerimônia seguiu.
noticiário e viajou do Paraná para rezar pelo
menino (Foto: Rafaella Fraga/G1)
"Dois anos sem Bernardo. Sem o nosso menino Bê. Além dele, nós rezamos por todas as vítimas aqui hoje. Nós rezamos a dor de tantos crimes que continuam acontecendo. A pergunta que a igreja hoje faz é: 'o que acontece nesse país com quem mata crianças? O que a lei faz com essas pessoas?'", questionou o padre Rudinei da Rosa.
Na porta da igreja, voluntárias distribuíram adesivos com o rosto de Bernardo: "2 anos sem Bernardo", dizia a mensagem. Foram impressas mil lembrancinhas, através de doações espontâneas, muitas de moradores de outras cidades do país.
Cerca de 400 pessoas compareceram. Além dos moradores da cidade e da região, pessoas de outros estados participaram da celebração. É o caso de Teodoro Gonçalves Padilha, de 52 anos, que viajou de Rio Azul, no Paraná, para rezar por Bernardo. "Vim ano passado e fui a Santa Maria também [cidade onde Bernardo foi sepultado]. Isso me faz bem. Ele era um menino bom", disse o agricultor, que conheceu Bernardo pelos noticiários e se comoveu com a história do menino.
à missa Foto: Rafaella Fraga/G1)
"Hoje a missa é principalmente para o Bernardo. Mas olhem a praça aqui de Três Passos. Tem uns meninos índios vendendo filtro dos sonhos, pedindo dinheiro. Não tem um pouco do Bernardo ali? Na casa de passagem, onde há vários meninos e meninas abandonados pelas famílias. Não tem um pouco do Bernardo lá também?", alertou o padre, em nova manifestação.
A missa foi celebrada pelo padre Rudinei da Rosa, na igreja que Bernardo foi frequentou durante boa parte da vida. O menino foi coroinha e fez a primeira comunhão ali. Religioso, também tinha intenção de fazer a crisma.
Por volta das 20h10, a missa terminou. Com a chuva, não foi realizada a caminhada pela cidade, que estava prevista.
Bernardo desapareceu no dia 4 de abril de 2014, data em que foi morto. O corpo do menino só foi encontrado dez dias depois, envolto em um saco plástico e enterrado em um buraco na área rural de Frederico Westphalen. A cidade fica a cerca de 80 quilômetros de Três Passos.
Quatro réus estão presos e respondem pelo crime: Leandro Boldrini, o pai, Graciele Ugulini, a madrasta, e os irmãos Edelvânia e Evandro Wirganovicz. Eles aguardam julgamento, ainda sem data marcada.
Investigação e julgamento
Desde abril de 2014, os quatro réus estão presos, e atualmente aguardam julgamento: o médico cirurgião Leandro Boldrini, pai da criança, a madrasta Graciele Ugulini, a amiga dela, Edelvânia Wirganovicz, e o irmão Evandro Wirganovicz.
A Polícia Civil investigou e concluiu que o menino morreu em razão de uma superdosagem do sedativo midazolan. Graciele e Edelvânia teriam aplicado o medicamento que levou o garoto à morte. Depois, as duas teriam recebido ajuda de Evandro para cavar a cova e ocultar o cadáver. A denúncia do Ministério Público ainda apontou que Boldrini foi o mentor de todo o crime.
A Justiça decidiu pelo júri popular para os quatro. No entanto, as defesas de Boldrini, Graciele e Evandro recorreram. O recurso começou a ser analisado em janeiro, mas foi suspenso e não tem data para ser retomado.
Relembre o caso
– Bernardo foi visto vivo pela última vez no dia 4 de abril de 2014. No início da tarde daquele dia, uma sexta-feira, Graciele foi multada por excesso de velocidade na ERS-472, em um trecho entre os municípios de Tenente Portela e Palmitinho. A mulher trafegava a 117 km/h e seguia em direção a Frederico Westphalen, que fica a cerca de 80 quilômetros de distância de Três Passos, onde a família residia. O Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) disse que ela estava acompanhada do menino.
– Bernardo morava com o pai, a madrasta e a filha do casal, à época com cerca de um ano, em uma casa em Três Passos. A mãe do menino, Odilaine, foi encontrada morta dentro da clínica do então marido em fevereiro de 2010. À época, a polícia concluiu que ela cometeu suicídio com um revólver. A defesa da mãe dela, Jussara Uglione, contestou a versão. O inquérito foi reaberto. Concluído em março deste ano, a nova investigação não apontou indícios de homicídio. Para a polícia, Odilaine se matou.
– A relação do pai e da madrasta com Bernardo era conturbada. Vídeos gravados no celular do pai e recuperados durante a investigação da morte do menino mostram brigas na casa da família e evidenciam a tensão doméstica entre os três. Em um deles, o menino grita por socorro, e discute com Graciele, que o ameaça. Em outro, o garoto pega um facão na mão, e é provocado pelo pai. As imagens são de 2013, um ano antes da morte de Bernardo.
– Imagens de uma câmera de segurança de um posto de combustíveis mostram os últimos momentos de Bernardo com vida. Ele aparece deixando a caminhonete da madrasta, e saindo com ela e com Edelvânia. Quase duas horas depois, as duas retornam para o mesmo local, mas sem Bernardo (assista ao lado). O vídeo foi decisivo para as investigações, porque mostra a madrasta chegando com Bernardo e retornando sem ele, esclarecendo também a participação de Edelvânia no caso, que dias depois revelou o local onde o garoto foi enterrado.
– O menino foi dado como desaparecido. O pai procurou a polícia para registrar o sumiço do filho no dia 6 de abril, um domingo. O corpo dele foi encontrado no dia 14 de abril, enrolado em um saco plástico e enterrado em uma cova rasa, em um matagal de Frederico Westphalen.
– Para a Polícia Civil, Bernardo foi morto com uma superdosagem do sedativo midazolan. Graciele e Edelvânia teriam aplicado o remédio que causou a morte do garoto e depois teriam recebido a ajuda de Evandro para cavar a cova e enterrar o corpo.
– A denúncia do Ministério Público ainda apontou que o pai atuou como mentor do crime, juntamente com Graciele. Segundo o MP, interceptações telefônicas (ouça os áudios) e laudos periciais comprovam. Boldrini nega.
– Em vídeo divulgado pela defesa de Edelvânia, ela mudou sua versão sobre o crime. Nas imagens (assista ao lado), ela aparece ao lado do advogado e diz que a criança morreu por causa do excesso de medicamentos dados pela madrasta. Na época em que ocorreram as prisões, Edelvânia havia dito à polícia que a morte se deu por uma injeção letal e que, em seguida, ela e a amiga Graciele jogaram soda cáustica sobre o corpo,para dissolver a pele do menino e eliminar provas. A mulher ainda diz que o irmão, Evandro, é inocente. A defesa de Graciele não comentou a nova versão.
– Em 16 de maio de 2014, a Justiça aceitou a denúncia contra os quatro, que tornaram-se réus no processo. Boldrini, Graciele e Edelvânia respondem por homicídio quadruplamente qualificado (motivos torpe e fútil, emprego de veneno e recurso que dificultou a defesa da vítima) e ocultação de cadáver. O pai também responde por falsidade ideológica. Já Evandro é acusado de homicídio simples e ocultação de cadáver.
– Um ano e três meses depois, saiu a sentença de pronúncia, que determinou o julgamento popular dos quatro réus. Ainda não há data para o julgamento. Enquanto isso, os advogados de Boldrini, Graciele e Evandro recorreram da decisão judicial. O recurso não foi apreciado. G1 RS