Na ausência de maioria clara na Câmara dos Deputados, onde o Centrão exerce total influência, e diante de apoio instável no Senado, o governo federal optou por fortalecer sua parceria com o Supremo Tribunal Federal (STF) como meio de assegurar a “palavra final” em disputas relacionadas à agenda legislativa e à distribuição de verbas no Orçamento da União. A aposta envolveu a nomeação pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a Corte do ex-ministro da Justiça Flávio Dino, de perfil explicitamente político, e a inclusão de um ex-integrante do Supremo na Esplanada, Ricardo Lewandowski, com histórico de decisões favoráveis aos petistas. Essa linha de mão dupla vai operar a todo vapor em fevereiro.
No entanto, a mais nova dinâmica de tensão entre os três Poderes da República pode resultar em consequências ainda mais desfavoráveis para o Planalto, caso seja mesmo levada adiante. Especialistas consultados pela Gazeta do Povo alertam que a utilização sistemática de ministros do STF para contornar decisões do Parlamento, aprovadas pela maioria dos deputados e senadores, pode provocar contra-ataque sem precedentes na história por parte do Legislativo, que detém poderes constitucionais para definir os limites do Judiciário e aplicar punições severas a magistrados dos tribunais superiores.
Ao longo dos últimos meses, analistas alertam para as movimentações do governo em direção ao STF e para as suas atitudes invasivas contra decisões sólidas do Congresso, cujo ápice veio no apagar das luzes de 2023, com a edição de Medida Provisória (MP) 1202/2023 para reonerar a folha de pagamento de salários de 17 setores econômicos. O gesto foi tomado logo após os parlamentares terem estendido a desoneração até 2027, piorando as tensões entre Executivo e Legislativo.
Em entrevistas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reitera a figura do presidente da República como peça central na resolução da questão sobre a cobrança de encargos previdenciários sobre a folha de salários, negando a influência imperativa do Congresso no atual cenário. Para evitar confrontos diretos com os líderes partidários e os chefes das duas Casas do Parlamento, tanto Lula quanto o ministro concentraram as críticas na “insensibilidade” dos empresários, embora estejam cientes de que a barreira a superar está no Legislativo. O destino da MP deverá ser selado na retomada das atividades legislativas, a partir da próxima semana, depois de o recesso ter sido tumultuado por operações da Polícia Federal (PF) que tiveram deputados da oposição como alvos.
Gazeta do Povo