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Juristas comentam a confusão sobre decisão da maconha no STF

O advogado crimininalista João Rezende esclarece, em primeiro lugar, que a maconha permanece sendo uma droga ilícita no Brasil. “Continua tendo um caráter ilícito o fato de portar maconha, mas essa ilicitude não está mais na esfera penal, está na esfera administrativa”, explica.

Além disso, a apreensão da droga continua ocorrendo, assim como a sua destruição. Persiste a confusão, contudo, sobre o usuário ser ou não conduzido para a delegacia. “Uma das diretrizes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal foi a de que esse procedimento não vai ser penal. Ou seja, na delegacia não será lavrado um auto de prisão em flagrante, nem vai ser lavrado um TCO – um termo circunstanciado de ocorrência –, porque não tem caráter penal. Vai ficar a cargo da delegacia o processo administrativo em relação à destruição da droga e à notificação do usuário, e também o seu encaminhamento para a realização do curso”, afirma.

A dúvida que fica, no entanto, é se para esse procedimento administrativo o policial precisa levar o usuário para a delegacia ou não. Rezende crê que “de forma imediata, a partir do julgamento do STF”, deve-se manter o procedimento padrão. “A pessoa vai ser apreendida com a droga pela polícia, vai ser conduzida para a delegacia da mesma forma, e notificada. Ou seja, as sanções tanto do inciso 1 quanto do inciso 3 do artigo 28 da Lei de Drogas continuam sendo aplicadas, conforme o próprio Supremo Tribunal Federal estabeleceu. Ela vai ser notificada e deve ser encaminhada para posteriormente fazer um curso sobre a droga.”

O delegado não poderá, contudo, lavrar o termo circunstanciado de ocorrência nem o ato de prisão em flagrante, mas continuará tendo que aplicar as sanções administrativas e fazendo as apreensões. “Agora, o Poder Executivo e o Legislativo precisarão definir se a pessoa deve ser encaminhada ou não para a delegacia, nessas apreensões”, afirma Rezende.

O jurista Fabricio Rebelo, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), considera que haverá, sim, mudança na prática da abordagem policial. “O fator crucial é sempre a quantidade. Então, se o indivíduo estiver com 40 gramas ou menos, a polícia não terá razão para conduzi-lo à delegacia, pois passará a ser presumível que se destina a consumo próprio e, com isso, não há crime”, diz. “Até a decisão do STF, como havia crime e apenas não havia pena, o indivíduo era conduzido, se lavrava a ocorrência e o caso ia para o juizado criminal, onde eram impostas as medidas socioeducativas. Agora, não há mais razão para sequer se conduzir”, completa.

Em qualquer caso, ao menos em tese, se houver indícios de tráfico de drogas – isto é, de negociação, entrega e distribuição da droga – o procedimento penal deve ser mantido. “A pessoa vai ser conduzida para a delegacia e, se for traficante, vai ser presa em flagrante, com todo o procedimento penal a respeito do tráfico de drogas, com base no artigo 33 da Lei de Drogas”, afirma Rezende.

Diversos elementos podem ser indício de tráfico de drogas, como anotações sobre comercialização e distribuição da droga, o porte de balanças e o acondicionamento fracionado, além da própria conduta da pessoa e de seus antecedentes criminais.

Para o capitão da Polícia Militar do Estado de São Paulo (PM-SP) Davidson Abreu, autor do livro “Tolerância Zero” (2021), o STF complicou o cenário para a abordagem policial, que já não era simples.

“A atuação da PM contra o uso e porte de drogas já era complicada antes no sentido operacional, pois, apesar de ser considerado crime, não gerava prisão, e as consequências eram muito brandas. Na prática, tirar uma viatura de seu setor de patrulhamento ou atendimento de ocorrências graves para a condução de alguém portando um cigarro de maconha, em que pelo menos dois policiais e uma viatura ficam inoperantes por horas, em um caso em que o conduzido era liberado antes do policial, gerava uma cadeia de descontentamento – isso no mundo real, porque claro que o policial é obrigado a cumprir seu dever, sob a pena de prevaricação. Agora, o problema se acentuou”, comenta.

Para ele, definir uma quantidade “não faz o menor sentido”, porque o que caracteriza o tráfico é a atividade comercial. “Já é prática dos traficantes andar com poucas quantidades para ter a possibilidade de usar a defesa do consumo próprio. Todo policial sabe disso. Agora, os traficantes têm algo mais a seu favor”, diz.

Por Gazeta do Povo

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