Avaliação é que definição pode trazer mais objetividade às análises e gerar menos distorções em julgamentos. (Foto: Reprodução)
O julgamento sobre descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal no Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não tem decisão final. O placar no momento está 5 a 3 a favor da descriminalização e o ministro Dias Toffoli pediu vistas.
O colegiado formou maioria para fixar uma quantidade da droga que diferencie consumo pessoal do tráfico – não há consenso, porém, sobre o número de gramas. Em reação, o Congresso pretende votar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que torna crime o porte e a posse, independentemente do volume.
Juristas dizem que a definição da quantidade tem potencial de dar mais objetividade às análises dos magistrados, mas apontam limitações, como considerar as circunstâncias em que a droga foi encontrada. Já entidades médicas reforçaram nesta semana oposição à medida, sob o argumento de riscos sociais e à saúde da medida.
A legislação atual sobre o tema é de 2006. Ela possui artigos distintos para usuários e traficantes, mas não oferece um parâmetro objetivo para que essa diferença seja estabelecida pela Justiça. A partir da implementação da legislação, a população carcerária brasileira sofreu uma elevação substancial e progressiva.
No Supremo, os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes citam em seus votos que a quantidade limite para diferenciar consumo próprio e tráfico deve ser de 60 gramas ou a posse de seis plantas fêmeas.
Já os ministros Kassio Nunes Marques e Cristiano Zanin, que votaram contra a descriminalização, estipulam uma porção de 25 gramas ou seis plantas fêmeas como limiar para distinguir os dois tipos de situação.
Outro integrante da Corte, André Mendonça defende quantidade ainda menor para a diferenciação: 10 gramas. O ministro Edson Fachin, por sua vez, entende que essa decisão não deve ser tomada pelo Judiciário, mas sim pelo Legislativo.
“Temos já uma maioria de votos pela fixação de uma quantidade diferenciadora, apenas com alguma divergência de qual será a quantidade”, disse o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, nessa quarta.
“Considero que esse é o aspecto mais importante do nosso julgamento, fixar uma quantidade que valha indistintamente para pobres e ricos relativamente a ser ou não traficante”, completou o ministro. Como o julgamento não terminou, porém, os ministros ainda podem mudar o voto.
Para Maurício Dieter, professor de Criminologia da Faculdade de Direito da USP, o marco objetivo deve ser considerado avanço. “Assim como a idade (18 anos) é uma regra objetiva que cria segurança jurídica nessa passagem, a adoção de critérios objetivos para drogas também é importante”, afirma.
“Se não tiver um critério objetivo, permite enorme discricionariedade, tanto do ponto de vista da ação policial, quanto da interpretação do Ministério Público, como da decisão judicial”, afirma. “E essa discricionariedade, por falta de elementos objetivos, vai ser transformar em arbitrariedade.”
Entidades médicas
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) reforçaram a posição contrária à descriminalização do porte de drogas. Para as entidades, a medida pode resultar no “aumento do consumo, no comprometimento da saúde (individual e coletiva) e no fortalecimento do narcotráfico”.
O poder público, dizem as entidades, deveria investir em estratégias efetivas de combate ao tráfico e melhorar a assistência médica e psicossocial aos usuários. CFM e ABP também argumentam que “não há experiência histórica ou evidência científica que mostre melhoria com a descriminalização de drogas ilícitas”.
A presidente do Instituto Igarapé, Ilona Szabó, apresentou argumento na linha oposta. Segundo a cientista política, países que já descriminalizaram o porte para consumo pessoal não tiveram alta da criminalidade.
“Portugal, que já descriminaliza todas as drogas para uso desde 2001, se tornou referência tanto na redução da violência e tratamento para dependentes químicos como pela diminuição significativa do consumo de drogas como cocaína e heroína”, disse.
“O país também conseguiu reduzir sua população carcerária por motivos relacionados às drogas, retirando a pauta da esfera criminal e a deslocando para o campo da saúde pública”, acrescentou.
Por jornal O Sul