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Dívida do governo do Rio Grande do Sul afeta investimentos em áreas essenciais

Recursos acabam pagando acordos firmados no passado. Com mais de R$ 73 bilhões de déficit, estado deve mais que duas vezes o que arrecada.

Por Cristine Gallisa, RBS TV

Dívida do governo do Rio Grande do Sul afeta investimentos em áreas essenciais

A dívida acumulada há décadas pelo governo do Rio Grande do Sul já chega a R$ 73,796 bilhões. A obrigação de pagar acordos firmados no passado acaba afetando diretamente nos investimentos em áreas essenciais.

O RBS Notícias apresenta a série “Contas em Crise”, que analisa a fundo as contas públicas do Rio Grande do Sul. A repórter Cristine Gallisa conversou com técnicos, economistas e profissionais, ligados ou não ao governo, para entender essa situação.

Foi com empréstimos que o estado encontrou, governo após governo, uma maneira de tapar os furos no caixa. Em 1995, o RBS Notícias informava: “o governo do estado vai buscar dinheiro no exterior para pagar dívida com União”.

Já na década de 1970 o governo começou a pagar as contas com empréstimos. Na época, a dívida era de cerca de R$ 2 bilhões. Em 1994, quando entrou em vigor o Plano Real, era de R$ 25 bilhões. E em apenas quatro anos, deu um salto gigantesco, chegando a R$ 55,6 bilhões.

  • Dívida com a União: R$ 57 bilhões
  • Bancos internacionais: R$ 6,7 bilhões
  • Precatórios: R$ 7 bilhões
  • Total da dívida em 2016: R$ 73,796 bilhões

“Um estado endividado com desquilíbrio fiscal, o impacto disso sobre a economia, sobre a população, primeiro serviço de educação e saúde precários, infraestrutura se deteriorando ao longo do tempo e você não tem capacidade de recompor, reinvestir no processo de infraestrutura, e isso afeta a produtividade, os investimentos privados, assim por diante”, analisa o economista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Fernando Ferrari Filho.

O governo federal, então, propôs aos estados a renegociação da dívida. O Rio Grande do Sul optou pelo recurso.

Esse acordo previa dois indexadores: o IGPDI mais juros de 6% ao ano, e um parcelamento de 30 anos. Só que o IGPDI é um indexador atrelado ao dólar, que tinha um valor fixo no início do Plano Real. O problema é que, logo depois, o dólar ficou muito valorizado. E fez a dívida crescer num ritmo muito maior que a capacidade que o estado tinha para pagar.

Mesmo pagando as parcelas, em vez de diminuir, a dívida só foi aumentando. E começou a sair do controle.

“Esse contrato que se firmou em 98 era para ter sido de parceria, de solidariedade de ajuda da União para os estados. Não só não foi de ajuda, como prejudicou os estados. Por quê? Exatamente pela arquitetura financeira do contrato que leva a consumir cada vez mais parcela da receita com o pagamento da dívida”, completa Josué Martins, do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Para aliviar o aperto nas contas, o estado passou a pagar somente uma parte da parcela mensal da dívida, jogando o restante em uma conta paralela, para o pagamento ser feito no fim do contrato. É como acontece quando se paga somente a parcela mínima do cartão de crédito.

O resultado é que o Rio Grande do Sul está devendo mais que duas vezes o que arrecada. E por isso não pode mais pegar nenhum empréstimo.

O governo decidiu, então, pedir socorro, mais uma vez, para a União. No ano passado, aderiu a um acordo que deu mais 20 anos de prazo para o pagamento. E mudou os índices que corrigem a dívida. Na prática, ela fica mais barata para se pagar.

“A renegociação da dívida já foi feita com sucesso ano passado. O RS foi protagonista dessa negociação. Mudou o indexador do IGPDI para o IPCA, e mudou o juro de 6% para 4%, isso produz um efeito benéfico para o RS agora e para o futuro, gigante. O que estamos falando agora é exatamente de atingirmos o equilíbrio fiscal, do ponto de vista financeiro. Dá para assegurar que estamos próximos de chegar lá”, diz o secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes.

Regime de recuperação fiscal

Para isso, o governo diz que é preciso agora aderir ao Regime de Recuperação Fiscal, oferecido pela União.

Se assinar esse acordo, o Rio Grande do Sul pode ficar três anos sem pagar a dívida, prazo que pode ser prorrogado por mais três. Isso significa deixar de enviar para Brasília, nesse período, cerca de R$ 11,3 bilhões.

“Ele nos dá um refresco por três anos, ou seja, não paga por três anos. É preciso entender que não é perdão da dívida, tudo que não pagar é acrescido ao saldo devedor, com os encargos de adimplência, IPCA mais 4% e, ao final desses três anos, vamos começar a pagar novamente. Claro que uma prestação mais alta do que se pagaria hoje. Nossa capacidade de gerenciar as finanças vai ficar mais reduzida”, projeta Josué Martins.

Para ter direito a esses benefícios, o estado precisa dar contrapartidas:

  • Tem que privatizar. Para isso, está oferecendo a CEEE, a CRM, a Sulgás e o BRDE, que são bancos de fomento.
  • Tem que reduzir incentivos fiscais para as empresas em 10% ao ano.
  • Não pode mais sacar dinheiro dos depósitos judiciais.
  • Como parte do acordo, o governo gaúcho também está propondo manter o aumento das alíquotas de ICMS, que garante R$ 2 bilhões a mais no caixa por ano.
  • Em três anos do acordo, o estado fica proibido de aumentar as despesas. Isso inclui aumento para o funcionalismo e criação de novos cargos. Contratação de pessoal, só se for para repor aposentadorias.
  • Teria que desistir de ações na Justiça, no futuro, questionando a dívida.

As medidas são polêmicas.

“Você contém a massa salarial, não repõe salário, não repõe os quadros, restringe concursos, incentiva a demissão voluntária, quando na verdade o estado, a maior função dele, é o de prestar serviço”, opina Josué Martins.

O governo diz que a vantagem é que dívida vai pesar menos no orçamento.

“O que é, em síntese, o equilíbrio fiscal exigido pela equipe econômica federal? É quando terminarmos os benefícios da carência de deixarmos de pagar a dívida, voltarmos a ter condições de pagar todas as despesas, inclusive a dívida, sem o sofrimento que temos hoje, ou sem a impossibilidade com a qual nos deparamos hoje”, afirma Feltes.

Mas a dívida não é o único desafio para as contas públicas. Também existe a Previdência, que é assunto para a próxima reportagem da série.

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