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Dez desafios da segurança pública do RS em 2020

Em balanço dos 12 meses do governo, vice e secretário da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior, reconhece a necessidade de encarar gargalos, como déficit de servidores.

 

Um ano após ser anunciado para o comando da Secretaria da Segurança Pública (SSP), uma das principais pastas do governo do Estado, o vice-governador Ranolfo Vieira Júnior recebeu a reportagem na última quinta-feira (26). Em seu gabinete, no 21º andar do Centro Administrativo Fernando Ferrari, apresentou balanço dos 12 meses e projetou estratégias para 2020.

O político, que já foi chefe da Polícia Civil e acumula 33 anos de serviço público, comemorou a queda nos crimes graves, mas reconheceu a necessidade de encarar gargalos, como déficit de servidores, parcelamento de salários e superlotação das prisões. Em janeiro, encontrar vagas no sistema carcerário havia sido o principal desafio apontado por ele para o primeiro ano no comando da segurança. Criou a Secretaria da Administração Penitenciária (Seapen), o que considera um acerto. Mas o Estado encerra o ano com déficit de 14 mil vagas. A aposta agora é na construção, ainda no primeiro semestre, de centro na Capital para fazer a gestão dos presos.

Na visão de Ranolfo, uma das medidas que permitiram reduzir os indicadores foi a criação do programa RS Seguro. Foram selecionados 18 municípios que concentravam mais de 70% dos crimes contra a vida no RS para serem priorizados. O secretário atribui a redução nos delitos especialmente a esse foco territorial. Considera que a implementação da Gestão Estatística em Segurança Pública (Geseg), por meio do qual são monitorados e debatidos mensalmente os indicadores dessas cidades, uma aposta para seguir reduzindo crimes. O projeto é inspirado em medida aplicada em Nova York nos anos 1990.

— A avaliação que faço nesse momento é sim muito positiva com relação ao que foi desenvolvido ao longo deste ano. Antes que tu me perguntes se estamos satisfeitos com os resultados: não, não estamos satisfeitos. Temos o dever de melhorar, e muito, ainda.

E não tenho dúvida de que vamos, com o desenvolvimento do nosso governo, reduzir a patamares bem inferiores a estes deste primeiro ano. Mas que já são positivos e extremamente importantes.

1) Indicadores

 Homicídio, latrocínio (roubo com morte) e roubo de veículos apresentaram reduções expressivas ao longo de 2019. Uma das quedas evidentes é a de assassinatos – indicador usado mundialmente para mensurar a violência. O Estado encerra 2019 com taxa de 15,5 homicídios para cada 100 mil habitantes, segundo projeção para dezembro realizada com base na média mensal do ano. Trata-se da menor desde 2010. No ano passado, a taxa era de 20,5, sendo que a mais alta foi registrada em 2017: 26,1.

— Nos dados de latrocínio temos os melhores resultados da década. Tivemos quase 5 mil veículos roubados a menos. Esse crime é muitas vezes o fato gerador do latrocínio. Não tenho dúvidas de que esse vai ser nosso maior desafio. Quando reduz muito, chega a um patamar no qual cada vez vai ficando mais difícil manter o nível de queda. Não colhemos todos os frutos ainda. O Geseg está amadurecendo e vamos aperfeiçoando a dinâmica dos encontros. Desta governança temos chance de colher maiores e melhores frutos. Temos muito a aperfeiçoar — diz Ranolfo.

2) Interior

O Estado tenta evitar que criminosos encontrem no Interior terreno para delitos. Nenhuma das 18 cidades do RS Seguro teve acréscimo de homicídios. Por outro lado, a SSP detectou que, até novembro, 99 cidades do Interior registraram mais assassinatos do que no mesmo período de 2018. Entre elas, Farroupilha, na Serra, que passou de quatro para 20 casos.

— Mapeamos entre 20 e 30 municípios, alguns até próximos dos 18 (do RS Seguro), com acréscimos e vamos dar atenção especial em 2020. Temos trazido às reuniões do Geseg alguns deles para que vejam como trabalhamos. O que temos feito pelos pequenos municípios é garantir que nenhum tenha menos de cinco brigadianos. Distribuímos viaturas, ampliamos batalhões de choque, de três para cinco, e incrementamos o efetivo.

3) Feminicídios

Ao contrário da maior parte dos indicadores, os feminicídios, que são as mortes de mulheres em contexto de gênero, não apresentaram a mesma redução. Até novembro – dados disponibilizados até o momento pela SSP –, a queda foi de 7% (de 100 para 93) em comparação com o mesmo período de 2018. No mês de novembro, houve aumento: de oito para 11 casos neste ano.

— Ao mesmo tempo em que é um crime de fácil elucidação, vai além da área policial. A prevenção é fundamental. Na conscientização da mulher, de procurar a polícia, e do agressor, de que quem cometer vai para a cadeia e ser condenado. A rede de atendimento é essencial. A mulher registra a ocorrência, mas volta para casa para morar no quarto ao lado ou no mesmo do agressor. O Estado tem de ter essa rede. Tivemos avanços: inauguramos Delegacia da Mulher em São Leopoldo e implementamos as Salas das Margaridas (espaço para atender vítimas inaugurado em nove delegacias). Temos preocupação da BM de incremento nas Patrulhas Maria da Penha. Isso vai ajudar, mas a prevenção é que vai quebrar paradigmas.

  • Até novembro, foram 93 mortes por questões de gênero
  • Redução de 7% em comparação a 2018

4) Necrotério

necrotério da Capital é um dos dilemas do Instituto-Geral de Perícias (IGP), órgão gerido pela SSP. O Departamento Médico-Legal (DML), na Avenida Ipiranga, padece de situação precária. Em maio, GZH mostrou que havia superlotação e que a câmara fria operava acima da temperatura ideal. Ao longo do ano, a reportagem contou histórias de familiares que tentavam retirar corpos de parentes. Segundo o IGP, o local opera dentro da capacidade – eram 42 corpos na última sexta-feira, 54 é o limite.

— Devemos estar inaugurando no primeiro semestre um núcleo, que é exemplo, que é o novo IGP. Aquele prédio que está sendo concluído em terreno limítrofe ao da SSP. Já vai ser um avanço. E, claro, estamos pedindo ao IGP, que providencie um estudo, para ver a possibilidade de construirmos um novo DML em Porto Alegre. Aquela é uma construção antiga. As condições não são nem as mais adequadas. Infelizmente não são adequadas. Vamos buscar uma solução a médio e longo prazos para o DML de Porto Alegre.

5) Prisões

Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
Ao longo do ano, GZH mostrou situação de presos em viaturas e DPsRonaldo Bernardi / Agencia RBS

O RS encerra 2019 com déficit prisional de 14 mil vagas. Na quinta-feira – dado mais recente –, eram 42,1 mil presos para 28 mil vagas. No momento, o governo tenta resolver impasse para inaugurar nova prisão em Sapucaia do Sul, com capacidade para 600 detentos. Para isso, precisa de autorização da prefeitura de São Leopoldo para obra de rede de esgoto. Outra ação tenta evitar que volte a acontecer acúmulo de presos  em viaturas, como em julho, quando havia 200 detidos nesta condição na Região Metropolitana. Na última sexta-feira, o número era inferior a 20 – menor índice no ano, segundo a Susepe.

 (A prisão de Sapucaia do Sul) Terá uniforme, produtos de higiene, alimentação. Nada entra de fora. Vamos analisar o perfil do preso e ocupar gradativamente, como em Bento Gonçalves (inaugurada em 2019). Teremos o Núcleo de Gestão Estratégica para o Sistema Prisional (Nugesp). Quem for autuado em flagrante, entra e vai para audiência de custódia. Se for liberado, volta para casa. Se for caso de tornozeleira eletrônica, vai colocar o equipamento. Se ficar preso, pode permanecer os primeiros 15 dias ali, até ser absorvido pelo sistema. Deverá ter em torno de 600 vagas. Seria exemplo para todo o Brasil. Queremos concretizar isso no primeiro semestre.

6) Salários

No início de dezembro, policiais civis e militares, assim como outros servidores estaduais, realizaram protestos contra o pacote do governo Leite, que altera as carreiras e a aposentadoria do funcionalismo. O Piratini tem enfrentado paralisações de categorias, e se vê obrigado a fazer concessões. Outro dilema é o parcelamento de salários, que inclui os servidores da segurança. Promessa de campanha do governo, a retomada do pagamento em dia não foi alcançada.

— Se não fosse o trabalho dos policiais, não teríamos esses resultados. Mesmo com salário atrasado, mesmo com essa discussão toda, continuam trabalhando. Esporadicamente estão em greve, mas efetivamente continuaram trabalhando. O atraso dos salários é sintoma da gravidade do problema. Se não tomar uma medida, a tendência é piorar. O servidor tem essa consciência de que chegamos à beira do precipício. Se nada for feito, o próximo passo é cair do precipício.

7) Investimentos

Em cenário de escassez de recursos, segundo a SSP, o Estado recorreu ao apoio da bancada federal para obter investimentos na área. Em 2019, foram aplicados R$ 138,6 milhões em segurança. Conforme a SSP, foram adquiridas 604 viaturas, 11 caminhões para bombeiros, 9,6 mil coletes balísticos e 342 armamentos. Contar com a iniciativa privada tem sido aposta. Em agosto, entrou em vigor a lei que permite que empresários invistam parte dos impostos na segurança.

8) Prevenção

O RS Seguro é dividido em quatro eixos: combate ao crime, prevenção, atendimento à população e sistema prisional. Em 2019, foram selecionadas 169 escolas estaduais e municipais em 52 bairros, dos 18 municípios do programa. Essas instituições devem receber projetos de secretarias (educação, esporte, cultura) para reduzir a vulnerabilidade de jovens.

— O Estado disputa o adolescente, o jovem, até a criança com o crime. Temos de oferecer perspectiva e expectativa melhor a essa criança e esse jovem. Isso passa por essa transversalidade. Segurança pública é a última porta. Antes dela, tu tens de ter saúde, educação, assistência social, política de geração de emprego e renda. É esse eixo que vai trazer resultado concreto a longo prazo. Aos poucos estamos começando a implementar políticas nesses locais. Queremos acentuar a ação do eixo 2, da prevenção. Não tenho dúvida que o resultado do futuro passa pela prevenção.

9) Servidores

A Brigada Militar e a Polícia Civil acumulam os maiores déficits de servidores na área da segurança do Estado. O RS conta com 48,7% dos 37 mil PMs que deveria ter. Os 5,2 mil policiais civis em atuação representam 57% do efetivo previsto em lei (9,2 mil) e 54% do considerado ideal (9,7 mil). Nos bombeiros, o déficit é de 960 (3.141 em serviço para 4.101 previstos). Dos 1.751 servidores do IGP previstos em lei, há 712 em atuação.

— Temos concursos públicos válidos, praticamente todos até o fim do nosso governo. O Estado passa por uma crise fiscal, previdenciária e econômica, que não tem como chamar todos ao mesmo momento. Projetamos um cronograma de chamamento ao longo dos próximos três anos (veja ao lado). Serão 4.459 novos servidores da segurança pública. Ao longo de 2019, formamos e distribuímos quase 3 mil servidores da segurança. No início do ano, devemos fazer o anúncio do cronograma de chamamento do IGP.

Cronograma
Março de 2020

  • 930 na BM (860 soldados e 70 capitães)
  • 105 nos bombeiros (80 soldados e 25 capitães)
  • 312 na Polícia Civil (262 agentes e 50 delegados)

Março de 2021

  • 923 na BM (858 soldados e 65 capitães)
  • 125 nos bombeiros (100 soldados e 25 capitães)
  • 290 na Polícia Civil (260 agentes e 30 delegados)
  • 450 na Susepe (400 agentes e 50 agentes administrativos)

Novembro de 2021

  • 923 na BM (858 soldados e 65 capitães)
  • 121 bombeiros (soldados)
  • 260 na Polícia Civil (agentes)

Março de 2022

  • 20 na Polícia Civil (delegados)

10) Facções

Tadeu Vilani / Agencia RBS
Cidade de Santa Bárbara do Sul teve boom de violência com a chegada de uma faccçãoTadeu Vilani / Agencia RBS

Em setembro, GaúchaZH mostrou como a presença de facção do Vale do Sinos mudou a rotina de Santa Bárbara do Sul, município de 8 mil habitantes no Noroeste. Uma das medidas adotadas para controlar o domínio das facções no RS foi o envio, em 2017, de lideranças para prisões federais. O secretário entende que a medida impactou na redução dos indicadores.

Ranolfo afirma que o Estado está atento para receber esses presos quando retornarem, devido às alianças que costuram.

— Não há dúvida que naquele momento foi importante. Por outro lado, o mundo do crime é dinâmico. Aquelas lideranças que foram retiradas, deram lugar a outras. É importante citar a lei sancionada pelo presidente (pacote anticrime), que permite que esses líderes possam ficar até três anos, renovável por mais três, no sistema federal. Estamos nos preparando para o momento em que esses indivíduos retornarem. É um dos senões de levar preso para o sistema federal. Outro senão foi a confirmação da construção da prisão federal em Charqueadas. É positivo, mas é uma preocupação. Líderes de outros Estados, serão recolhidos aqui.

Gauchazh

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