Trata-se de um evento que deve ser interpretado em sua dimensão efetiva. Parte conclusiva de seminários online, o dossiê traz informações essenciais para o esclarecimento, a conscientização e o protagonismo social, em disputa essencial para a vida de todos. Literalmente de todos, posto que se opõe ao modelo de produção dependente de subsídios e de agrotóxicos que vêm destruindo os ecossistemas, a serenidade e a saúde das famílias, bem como a democracia e a soberania nacional.
Na base do problema, temos as evidências de uso massivo de instrumentos voltados à alienação do povo brasileiro, com a conivência do Estado, semeando mitologias que ocultam crimes praticados em nome daquele modelo. Nesta perspectiva, formadores de opinião, parlamentares, juristas e cientistas de aluguel, iluminados por campanhas bilionárias atuantes em favor de interesses contrários à vida digna, tentam – com algum sucesso – pacificar a crescente indignação social quanto ao tema dos agrotóxicos e suas implicações.
De outro lado, esforços independentes, diversos e persistentes, desenvolvidos por ações coletivas, tratam de produzir fatos, conhecimentos e documentos, que atuam no rumo oposto, contribuindo para desmantelar aquelas mitologias e desmascarar seu pretenso monopólio sobre informações cientificamente válidas. Como exemplo das grandezas envolvidas, considere-se os gastos bilionários da Campanha “o Agro é POP”, que vem há anos tentando obscurecer conteúdos trazidos a público por obras como O Veneno Está na Mesa, de Silvio Tendler (ver abaixo), o Dossiê Abrasco e outras iniciativas similares.
O Veneno Está na Mesa (I)
O Veneno Está na Mesa (II)
Com enorme limitação de recursos, e em que pese a brutal assimetria de poderes, estamos vencendo. Percebe-se que, em suas reações, o agronegócio internacional já não se satisfaz com a captura dos poderes da República. Isto porque, mesmo garantindo negociações vantajosas, não consegue evitar que a opinião pública escape da nuvem de desinformações que a mantém alheia aos desdobramentos da neocolonização e da rapinagem com que o Brasil vem sendo depredado. Por isso, e aproveitando o atual desgoverno e a facilidade das transações criminosas que nele prosperam, aqueles atores se apressam em alterar as bases do contrato social nos regula como nação. E é para mais bem reagirmos contra esta iniquidade, que dispomos, a partir de agora, do Dossiê Contra o Pacote do Veneno e em Defesa da Vida.
Além de sua profundidade em termos de conteúdos, este documento merece destaque pela maneira como foi construído. Trata-se de obra coletiva, que vem a público no contexto de seminários que trabalham com profundidade cada um dos tópicos envolvidos na complexa disputa de modelos, apontando suas articulações. A centena organizações participantes da Campanha se empenha, desta forma, em estimular verdadeira mobilização nacional para enfrentamento de interesses que unem, ao tema dos agrotóxicos, os monocultivos transgênicos, o avanço de doenças crônicas, a criminalização de organizações sociais e ambientalistas, além da ameaça de fascismo e das tragédias relacionadas à pandemia e ao retorno do Brasil ao mapa da fome. Estes e outros dramas que se aceleram no contexto atual precisam ser compreendidos em suas conexões mais amplas, que se relacionam à preservação da vida do solo, à qualidade das águas, à produção de alimentos, à construção de sociabilidades, a elaboração de conhecimentos e à proteção do contrato social estabelecido na Constituição Federal de 1988. Ali estão fixadas obrigatoriedades governamentais no sentido de garantir proteção à saúde humana e ambiental, ao trabalho, à alimentação e à informações que permitam atitudes conscientes, do povo, em busca de acesso a estes e outros direitos constitucionais. Ora, o tratamento preferencial concedido aos agrotóxicos simplesmente frauda a Constituição e impede a realização de premissas básicas ali fixadas para organizar a vida nacional.
Os interesses a serem enfrentados incluem ampla articulação no Congresso Nacional, cuja maioria, que já sustentou o golpe de 2016 e a eleição de Bolsonaro, agora pretende regularizar o “Pacote do Veneno”. Trata-se do Projeto de Lei n.º 6.299/2002, que sem bases de fundamentação ética, científica, econômica ou moral, e mesmo contando com a rejeição explícita de centenas de sociedades científicas, órgãos técnicos das áreas de saúde e ambiente, e da sociedade civil organizada, por tramitar na semi invisibilidade, pode vir a ser aprovado. Para contribuir neste debate e impedir tal desfecho, o Dossiê CONTRA o PACOTE do VENENO e EM DEFESA DA VIDA reuniu, avalia e interpreta 25 Notas Técnicas públicas contrárias ao Pacote do Veneno, bem como a única (e duvidosa) nota técnica pública emitida em seu favor. Espera-se que a sociedade brasileira se aproprie destes conteúdos e os utilize para pressionar parlamentares e conter suas eventuais traições.
Nesta perspectiva instrumental, o dossiê também reúne os argumentos que sustentam o PL n.º 6.670/2016 que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA). Esperamos que a PNARA, com o empenho da sociedade civil esclarecida e motivada, venha a ser aprovada. O documento também sumariza e aponta casos concretos ilustrativos de avanços robustos, que podem e devem ser multiplicados, com vistas à generalização de modelos produtivos de base agroecológica. O Dossiê foi elaborado com esforços voluntários e apoio financeiro do projeto “Agenda Estratégica de Pesquisa-Ação em Saúde no Tema dos Agrotóxicos” vinculado à ABRASCO, ABA, Fiocruz e financiado pelo Instituto Ibirapitanga. Um pool de 4 editoras – Hucitec, Expressão Popular, Abrasco e Rede Unida – vão possibilitar o alcance dessa obra a diferentes e maiores públicos.
Recomenda-se a todos brasileiros interessados no tema, que acessem os debates que o sustentam. Neste caso, as iniciativas promovidas no âmbito da Mobilização Nacional Contra os Agrotóxicos que, em seu primeiro encontro, tratou da realidade dos Agrotóxicos e Transgênicos no Brasil. Enquanto, no segundo encontro, o debate foi sobre as políticas e práticas de redução de agrotóxicos, onde se apresentou diversos estudos que trata da regulamentação e sanções sobre os agrotóxicos.
Já no terceiro e penúltimo encontro, discutiu-se a contradição entre o pseudo sucesso do agronegócio dependente de subsídios e agrotóxicos, a crise alimentar e o avanço intoxicações em áreas afetadas pelos venenos, bem como o avanço de experiências exitosas, de base agroecológica e de produção orgânica. Nesta terça-feira, dia 6 de julho, ocorrerá o último encontro da mobilização nacional onde lançaremos o Dossiê CONTRA o PACOTE do VENENO e EM DEFESA DA VIDA com a participação de Leonardo Boff, de demais autores e lideranças estão confirmadas. Participe conosco:
Por Leonardo Melgarejo
(*) Engenheiro Agrônomo, doutor em Engenharia de Produção, participa do Movimento Ciência Cidadã e da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida