Carlos Rivaci Sperotto estava no sétimo mandato como presidente da Farsul e morreu neste sábado (23)
Andréa Graiz / Agencia RBS
Impossível falar do agronegócio gaúcho sem mencionar Carlos Rivaci Sperotto, morto neste sábado (23). Nos últimos 20 anos, os dois se misturam e formam uma coisa só.
Foi à frente de uma das principais entidades do setor, a Federação da Agricultura do Estado (Farsul), que nasceu esse personagem emblemático. Mas não foi apenas o longo tempo como presidente – ele estava no sétimo mandato – que o alçou à notoriedade.
Sperotto era um homem de opiniões fortes. Brigava com unhas e dentes pelas posições em que acreditava. Destemido e mandão, como ele mesmo se reconhecia, batia de frente com quem quer que fosse.
Foi pelas mãos dele que muitas conquistas do setor vieram. Como a renegociação das dívidas dos produtores no final da década de 1990 _ feito este que ele considerava o maior de sua gestão, como disse em entrevista sobre os 90 anos da entidade, comemorados neste ano.
Sperotto também teve papel fundamental para a adoção dos transgênicos no Rio Grande do Sul. E viveu momentos de tensão e polêmica. Como no foco de febre aftosa em Joia, no ano 2000, saindo em defesa da indenização dos pecuaristas.
Outro embate forte foi com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra em razão da reforma agrária, que se intensificou durante o governo Olívio Dutra.
Ao longo dos anos, aprendeu, no entanto, que nem sempre a disputa era o caminho. E mais recentemente vinha trabalhando com o que chamava de política de resultados.
– A gente tem de saber ser mandão. Ser mandão sem agredir, sem ferir, oportunizando a busca da solução – disse ele em entrevista concedida a Zero Hora em 2015.
Nesta mesma conversa admitiu que, em casa, não dava, mas sim, recebia ordens.
– O Sperotto pai e avô é peão.
E mesmo diante da luta contra o câncer, não esmoreceu. Se manteve ativo, sempre acompanhando de perto o que acontecia na entidade.
No nosso último encontro, fez o que era de praxe. Disse, em tom taxativo: senta aqui, guria. Porque o Sperotto era assim. Não pedia licença para agir.
Corpo de Carlos Sperotto é cremado em Porto Alegre
Falecido neste sábado (23) em decorrência de um câncer no aparelho digestivo, líder do agronegócio gaúcho foi cremado hoje na Capital
O salão nobre da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), em Porto Alegre, parecia pequeno diante da quantidade de familiares, amigos e colegas dispostos a prestar uma última homenagem ao líder ruralista Carlos Sperotto, falecido neste sábado (23) em decorrência de um câncer no aparelho digestivo. O velório do presidente da Farsul estendeu-se ao longo da noite e, na manhã deste domingo (24), o número de coras de flores que tomavam conta do ambiente já passava das dezenas.
Nas rodas de conversa que se encontravam pelo salão, lideranças políticas e do setor do agronegócio relembravam momentos marcantes da trajetória do homem que esteve, nos últimos 20 anos, à frente de uma das mais influentes instituições do Rio Grande do Sul. Entre os presentes, estava a senadora Ana Amélia Lemos (PP/RS).
— Não fosse a atuação de pessoas como Sperotto, a economia do nosso país estaria padecendo de uma crise sem precedentes. Do campo é que sai toda a riqueza e ele, mesmo nos momentos mais agudos, posicionou o Rio Grande do Sul sempre à frente de debates importantes como o código florestal, o Funrural, as patentes de produtos modificados geneticamente… Isso dimensiona a relevância da Farsul diante desse setor estratégico da economia brasileira que é o agronegócio —, comentou a senadora para GaúchaZH.
Além de seu trabalho na Farsul, Sperotto também atuava como representante da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) na Federações das Associações Rurais do Mercosul, integrando diversos grupos técnicos e setoriais ligados à agropecuária. É o que relembra Mário Borba, vice-presidente da CNA, que veio despedir-se do amigo com quem conviveu por 17 anos.
— De Carlos destaco sua forte liderança, a garra e a seriedade com que esteve à frente da Farsul. Foi um homem que nunca desistiu, estando envolvido em ações de forte impacto no setor, como o “caminhonaço” e o “tratoraço”. Em sua última ida à CNA, já fazendo quimioterapia, viajou para Brasília para votar e garantir a unanimidade em uma eleição. É isso que ele deixa como marca: o comprometimento.
Após a benção de um padre realizada no próprio salão da Farsul, uma salva de palmas marcou a despedida dos amigos presentes. Na sequência, o corpo de Carlos Sperotto foi encaminhado ao Crematório Metropolitano, onde foi cremado em cerimônia íntima, apenas para familiares, no início da tarde deste domingo (24).
Mais lembranças
Para a senadora Ana Amélia Lemos, uma das principais características do presidente da Farsul era sua forte conexão com o campo.
— Sperotto deixa um legado mais do que positivo para a agropecuária gaúcha e brasileira. Foi um líder combativo, polêmico algumas vezes, mas sempre tendo em vista a correção e a retidão de propósitos. Defendia com convicção o setor, que vive lidando com crises cíclicas, sempre fazendo o bom combate. Essa é a marca que deixa de forma indelével na gestão da Farsul ao longo de tanto tempo e que a entidade certamente seguirá trilhando, em homenagem a sua memória.
Já o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes relembrou o período em que trabalhou ao lado de Sperotto para viabilizar a renegociação das dívidas dos produtores rurais, em 1999.
— Foi um momento importante onde começamos um movimento que acabou levando em torno de 20 mil produtores a Brasília, para negociar diretamente com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Esse foi um divisor de águas que viabilizou ao produtor rural se transformar no grande eixo do crescimento e do desenvolvimento da nação dos últimos 20 anos. Foi a partir da liderança de Sperotto junto ao trabalho feito com os parlamentares que viabilizamos o debate de temas como a securitização, as negociações com as cooperativas e a Moderfrota. Nos últimos 12 anos em que eu estou afastado da vida pública parlamentar, sempre que vinha à Expointer visitava o Sperotto, pois ele fez parte da história que possibilitou transformar o agronegócio no Brasil.
O secretário da Agricultura do Estado Ernani Polo também destacou o trabalho de Sperotto nos últimos 20 anos, grande parte deles como presidente da Farsul.
— Uma pessoa de opiniões firmes e personalidade forte que liderou momentos importantes da agricultura e da pecuária brasileira, entre eles a securitização da dívida dos produtores, o debate da biotecnologia, a liberação dos transgênicos e o direito da propriedade. Enquanto esteve à frente da Farsul, o agronegócio se transformou muito, caminhando para uma produção altamente tecnificada. Fica então esse legado de trabalho em prol do agronegócio gaúcho e brasileiro.
Gauchazh